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FACULDADE DE DIREITO DE LISBOA

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Cidade de Penafiel, ano de 1972, local de trabalho: Caixa Geral de Depósitos.

Toda a gente gosta de nós e as tarefas diárias não são repetitivas.

Mas urge colmatar esta lacuna que me vem perturbando.

Faço uma preparação breve e venho a Lisboa.

Apresento-me no exame de admissão à Faculdade de Direito, ao abrigo do regime em boa hora criado pela reforma do ilustre professor Veiga Simão.

Submeto-me às provas de Filosofia, Cultura Geral e Latim.

A prova de Latim safa-me.

Volto, mais tarde, à prova oral.

O Júri é composto por três doutos lentes, dois da própria Faculdade e um deles emprestado pela Faculdade de Letras.

- Por onde é que tens andado, Bentinho? – pergunta-me o professor doutor frei Joaquim Cerqueira Gonçalves, frade da Ordem Franciscana e docente da Faculdade de Letras de Lisboa.

Sorrio, encolho os ombros e, surpreendido pela inesperada interpelação, não encontro palavras para a resposta.

Minutos mais tarde, veio a resposta, pela voz de uma empregada da Faculdade: passei na prova oral!

Regresso, contentíssimo, a casa dos meus Pais, em Benfica:

- Pai, passei, já entrei na Faculdade de Direito! -exclamo, ao ver o meu pai no corredor.

- Não admira – diz ele. – Sempre foste muito inteligente.

Volto para Penafiel, já com os livros do primeiro ano debaixo dos braços.

É chegada a hora de aproveitar os tempos livres no estudo dos Códigos, das Sebentas e dos Apontamentos de terceiros.

Na época própria, volto de novo a Lisboa e apresento-me na Faculdade de Direito.

Fazem as chamadas e, acto contínuo, vem uma ordem inesperada:

- Os vossos livros ficam todos cá fora! – grita a empregada da Escola.

- Então o que é que eu posso levar? – pergunto de imediato.

- Leve uma caneta ou uma esferográfica. Lá dentro dão-lhe o papel – acrescenta.

- Nada mais?! – volto a perguntar, atónito.

- Nada mais!!! – acrescenta a empregada, desta vez gritando também comigo.

Faço o teste e, sem tempo para esperar pela nota, regresso no mesmo dia a Penafiel.

Mais tarde, um Amigo comunica-me:

- Tiveste positiva.

Suspirei de alívio.

Voltei mais tarde à Faculdade.

À porta, dois “gorilas” vigiam os alunos.

Um dos alunos dá-me um papel.

Paro no amplo átrio da Faculdade a ler o “comunicado dos estudantes”.

Aproxima-se de mim um indivíduo de gabardine clara:

- O que é que tem aí? – pergunta-me, com ar agressivo.

- Tenho este papel que me deram à entrega – respondo.

- Você não sabe que não pode ler isso? – pergunta de novo.

- Não, não sabia! – respondo, sem entusiasmo.

- Dê cá isso! – ordena

Dou-lhe a folha de papel e viro-lhe as costas.

- É um gajo do Pide, sabias? – esclarece um aluno que presenciara a cena.

- Não, pá, não sabia! – respondo, convicto de que estou a fazer figura de parvo.

A Escola estava alvoroçada, pois, dias antes, um agente da Pide havia assassinado, a tiro, um estudante.

Dá-se, no entretanto, a Revolução dos Cravos.

Um amigo de Lisboa telefona-me para Penafiel:

- Bentinho, a Faculdade começou a dar aulas para os Estudantes Trabalhadores, no período pós-laboral.

Vou de imediato a Lisboa e, na sede da CGD, trato de pedir de imediato a minha transferência para Lisboa.

- Há uma vaga na Agência de Benfica, quer? – pergunta-me o colega dos recursos humanos.

- Claro que quero – respondo de imediato.

Arrendo casa na Damaia de Baixo e, sem tardança, começo a frequentar as aulas de Direito.

 

 - Continua no próximo capítulo.

 

António Bentinho, Advogado

 

 

 

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